Decisão TJSC

Processo: 5003868-40.2023.8.24.0004

Recurso: Recurso

Relator:

Órgão julgador:

Data do julgamento: 19 de dezembro de 2006

Ementa

RECURSO – Documento:7051499 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA Apelação Nº 5003868-40.2023.8.24.0004/SC PROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 5003868-40.2023.8.24.0004/SC DESPACHO/DECISÃO J. L. E. ajuizou a ação ação de conhecimento com pedido de reparação de danos n. 5003868-40.2023.8.24.0004, em face de Banco do Brasil S.A e Banco Inter S.A, perante a 1ª Vara Cível da Comarca de Araranguá. A lide restou assim delimitada, consoante relatório da sentença da lavra do magistrado Valter Domingos de Andrade Junior (evento 43, SENT1): J. L. E. promoveu ação em face de BANCO DO BRASIL S.A. e BANCO INTER S.A. A parte autora narra ter sido vítima do crime de estelionato em 27/12/2022, ao receber uma ligação de pessoa que se passava pelo escritório de seu advogado, informando que teria ganhado uma ação e, para liberar o valor, deveria realizar transferências via PIX totalizando R$ 3.750,96. Ao constatar o golp...

(TJSC; Processo nº 5003868-40.2023.8.24.0004; Recurso: Recurso; Relator: ; Órgão julgador: ; Data do Julgamento: 19 de dezembro de 2006)

Texto completo da decisão

Documento:7051499 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA Apelação Nº 5003868-40.2023.8.24.0004/SC PROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 5003868-40.2023.8.24.0004/SC DESPACHO/DECISÃO J. L. E. ajuizou a ação ação de conhecimento com pedido de reparação de danos n. 5003868-40.2023.8.24.0004, em face de Banco do Brasil S.A e Banco Inter S.A, perante a 1ª Vara Cível da Comarca de Araranguá. A lide restou assim delimitada, consoante relatório da sentença da lavra do magistrado Valter Domingos de Andrade Junior (evento 43, SENT1): J. L. E. promoveu ação em face de BANCO DO BRASIL S.A. e BANCO INTER S.A. A parte autora narra ter sido vítima do crime de estelionato em 27/12/2022, ao receber uma ligação de pessoa que se passava pelo escritório de seu advogado, informando que teria ganhado uma ação e, para liberar o valor, deveria realizar transferências via PIX totalizando R$ 3.750,96. Ao constatar o golpe, realizou Boletim de Ocorrência e entrou em contato com a Central de Atendimento dos Réus, mas foi informada da impossibilidade de estorno, pois se tratava de um golpe e não de uma fraude. Argumentou que a omissão das instituições financeiras em realizar a devolução dos PIX pelo Mecanismo de Devolução e a ausência de verificação de possível fraude da parte delas em relação a transação deram causa aos prejuízos e atraem a responsabilidade civil das rés. Pediu  a condenação das rés ao ressarcimento do dano material no valor transferido (R$ 3.750,96) e indenização por danos morais no valor de R$ 7.000,00. O BANCO INTER S.A. apresentou contestação arguindo, preliminarmente, a sua ilegitimidade passiva, por entender que o pedido está vinculado ao destinatário do PIX, e não à instituição que apenas recebeu os valores na conta aberta de forma regular. No mérito, alegou a inexistência de falha na prestação de serviços, pois as transferências foram realizadas pelo autor, por livre e espontânea vontade, após inserir os dados bancários e validação do Banco do Brasil. Defendeu que a única razão para a fraude foi o agir descuidado e negligente do  autor (culpa exclusiva da vítima). Requereu a improcedência dos pedidos. BANCO DO BRASIL S.A. apresentou contestação arguindo, preliminarmente, a inépcia da inicial. No mérito, defendeu a inocorrência de falha operacional ou tecnológica, ressaltando que as transações foram realizadas com o uso efetivo da senha, que é pessoal e intransferível. Sustentou que a preservação do sigilo da senha é responsabilidade exclusiva do titular. Argumentou que o infortúnio decorreu de delito por engenharia social e que o dano sofrido é decorrente de culpa exclusiva da vítima (art. 14, §3º, II, do CDC). Colacionou jurisprudência do STJ afastando a responsabilidade de instituições financeiras em casos de uso de cartão original e senha pessoal pelo correntista. Requereu igualmente a improcedência dos pedidos. Houve réplica. A decisão do e. 26 afastou as preliminares e negou a inversão do ônus da prova, determinando que a parte Autora comprovasse o acionamento do Mecanismo Especial de Devolução de valores (MED). As partes se manifestaram. É o relatório. Na parte dispositiva da decisão constou: Ante o exposto, e por tudo mais que dos autos consta, com fundamento no art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil, JULGO IMPROCEDENTES os pedidos formulados por J. L. E. na presente Ação de Conhecimento em face de BANCO DO BRASIL S.A. e BANCO INTER S.A. Condeno a parte Autora ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, estes fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, nos termos do art. 85, § 2º, do CPC, observada eventual gratuidade e as isenções legais. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Transitada em julgado, arquivem-se. Irresignada, a parte autora interpôs Recurso de Apelação (evento 49, APELAÇÃO1), defendendo, em síntese, que: a) "não há que se falar na possibilidade de as Apeladas se eximirem da responsabilidade de auditoria e monitoramento das atividades bancárias incomuns de seus correntistas"; b) "é nítida a responsabilidade das Apeladas sobre os danos causados ao Apelante, porquanto somente foi possível a sua confecção em razão da desídia e negligência das Apeladas em permitirem que os estelionatários abrissem uma conta em suas empresas com dados falsos"; c) "é evidente que as Apeladas causaram danos ao Apelante, não somente na esfera patrimonial, mas também na esfera extrapatrimonial". Ao final, requereu o conhecimento e provimento do recurso. Com as contrarrazões (evento 57, CONTRAZAP1 e evento 58, CONTRAZAP1), ascenderam os autos a esta Corte de Justiça. É o relatório. Decido. 1. Do julgamento por decisão monocrática terminativa Inicialmente, saliento ser plenamente possível o julgamento do presente recurso por decisão unipessoal, haja vista que, sobre a matéria de direito, a posição desta Corte de Justiça é uniforme (TJSC, Apelação n. 5007336-60.2022.8.24.0064, do , rel. Álvaro Luiz Pereira de Andrade, Sétima Câmara de Direito Civil, j. 29-08-2024; TJSC, Apelação n. 5024541-76.2022.8.24.0008, do , rel. Haidée Denise Grin, Sétima Câmara de Direito Civil, j. 29-08-2024). 2. Do mérito O cerne recursal consiste em definir se as instituições bancárias, ora requeridas, são responsáveis pelos prejuízos sofridos pelo autor em decorrência do "golpe do falso advogado". Conforme evidencia o cenário fático posto nos autos, o demandante foi ludibriado por um terceiro golpista que se passava por preposto de escritório de advocacia e, acreditando que receberia valores de uma ação judicial, transferiu quantias de sua conta bancária do Banco do Brasil S.A (banco pagador) para a contas vinculadas ao Banco Inter S.A (banco recebedor), via PIX. Embora seja inconteste que o próprio autor realizou ambas as operações bancárias, sem qualquer participação dos réus no engodo que acabou por lhe vitimar, aquele sustenta que estes são responsáveis pelo evento danoso, na medida em que "facilitaram abertura de contas bancárias para falsários, não cuidaram de procedimentos mínimos de segurança na abertura de contas bancárias e permitiram que falsários sem nenhuma identificação real se utilizassem de contas bancárias para receber transferências provenientes de crimes", bem como falharam nas "verificações de transações incomuns de seus correntistas". Razão, contudo, não lhe assiste. De início, impende sedimentar que a relação jurídica subjacente à lide é típica de consumo, pois, de um lado, tem-se a figura do consumidor (pessoa natural destinatária final dos serviços bancários) e, de outro, a dos fornecedores de serviços (instituições que atuam no ramo bancário, inclusive a cooperativa de crédito), nos exatos moldes prescritos nos arts. 2º e 3º do CDC. Aliás, orienta a Súmula 297 do Superior Tribunal de Justiça que "o Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras". Nesse contexto, a fim de equalizar as posições contratuais marcadas pela desigualdade de forças entre fornecedor e consumidor, o CDC prevê a responsabilidade objetiva daquele em reparar os danos por este sofridos (arts. 12, 14 e 16), em conformidade com o disposto no art. 927, parágrafo único, do CC. No mais, como corolário da teoria do risco da atividade, são deveres das instituições financeiras não apenas prestar informações precisas aos correntistas acerca dos créditos e débitos lançados em suas contas bancárias e do uso do cartão, como também manter mecanismos de segurança efetivos a ponto de resguardar o capital a si confiado com zelo e prudência - o que compreende a identificação de movimentações suspeitas e atípicas. A propósito, prevê a Súmula 479 do Superior Tribunal de Justiça que "as instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos gerados por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias". Com efeito, do que se percebe dos autos, possível concluir que a fraude praticada pelos estelionatários somente foi possível mediante colaboração do consumidor que foi induzido a erro e procedeu a transferência da quantia subtraída. Isso porque, a transação foi realizada com dados que são de uso exclusivo do titular da conta bancária, tais como senha pessoal, token de segurança e dentro do aplicativo do banco. Em que pese a alegação da parte autora de que houve falha na prestação do serviço e, consequentemente, na responsabilidade objetiva das instituições financeiras (Súmula 479 do STJ), razão não lhe assiste. No ponto, salienta-se que, nos casos de transações via Sistema PIX realizadas mediante fraude, o Banco Central criou o Mecanismo Especial de Devolução (MED), procedimento para restituir ao consumidor o valor transferido. A Resolução nº 103/2021 do BACEN estabelece que: Art. 41-B. O Mecanismo Especial de Devolução é o conjunto de regras e de procedimentos operacionais destinado a viabilizar a devolução de um Pix nos casos em que exista fundada suspeita do uso do arranjo para a prática de fraude e naqueles em que se verifique falha operacional no sistema de tecnologia da informação de qualquer dos participantes envolvidos na transação. Dessa forma, é dever da instituição financeira, quando solicitado pela parte autora, implementar o MED para recuperar ou diminuir os prejuízos do consumidor em relação à fraude ocorrida. Ocorre que, conforme o próprio autor mencionou em sua manifestação, "não se recordou da possibilidade de notificar os bancos para acionar o MED, em razão de seu estado de choque". Ademais, acertado o entendimento exarado na origem de que: Embora o Banco Central imponha o dever de as instituições financeiras realizarem verificações de segurança e rejeitarem transações em caso de fundada suspeita de fraude (Resolução BCB n.º 1/2020), é impossível exigir que os bancos verifiquem minúcias de todas as transações realizadas pelos seus correntistas. A dinâmica do PIX é a de transferência instantânea e ficaria prejudicada no caso de se exigirem das instituições financeiras verificações individualizadas de cada transação. A alegação da Autora de que o valor transferido seria "completamente diferente daqueles que costuma fazer diariamente" não é suficiente para configurar a falha no serviço. A transação foi de valor não muito elevado, efetuada pelo titular da conta, mediante sua senha pessoal, inserindo os dados e a chave PIX, o que a torna formalmente válida. Não havia ali nada que induzisse por si só a ocorrência de fraude. E nem se cogite responsabilizar as mantenedoras das contas às quais os valores foram transferidos ao simples argumento de que teriam facilitado a abertura em nome de falsários, uma vez que o liame entre os prejuízos e referido ato é extremamente distante, seja à luz da teoria da causalidade adequada ou dos danos diretos e imediatos. A propósito, seguem precedente desta Câmara: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. PEDIDO DE REPARAÇÃO DE DANOS MATERIAIS E MORAIS EM RAZÃO DE GOLPE PERPETRADO POR TERCEIROS. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. RECURSO DA AUTORA. MÉRITO. ALEGADA ILICITUDE DE CONDUTA DE FORNECEDOR PELA FALTA DE FISCALIZAÇÃO ADEQUADA PARA ABERTURA DE CONTA DE PAGAMENTOS. INSUBSISTÊNCIA. DEMONSTRAÇÃO DE EXIGÊNCIA DE DOCUMENTOS. AUSÊNCIA DE PROVA MÍNIMA DE QUE AS CONTAS SERIAM FRAUDADAS. OUTROSSIM, NEXO DE CAUSALIDADE NÃO CONFIGURADO. EXTORSÃO PRATICADA POR MELIANTES APÓS A AUTORA INADVERTIDAMENTE DAR ACESSO A ELES A SEU CELULAR. REQUERENTE QUE PRONTAMENTE CEDEU À CHANTAGEM. FORTUITO EXTERNO. CULPA EXCLUSIVA DO CONSUMIDOR OU DE TERCEIRO. PRESENÇA DE EXCLUEDENTE DE RESPONSABILIDADE. SENTENÇA MANTIDA. FIXAÇÃO DE HONORÁRIOS RECURSAIS. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. (TJSC, AC 5001699-45.2024.8.24.0069, rel. Marcos Fey Probst, Sexta Câmara de Direito Civil, j. 27.05.2025). APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE REPARAÇÃO POR DANOS PATRIMONIAIS. PARTE QUE SOFREU GOLPE DE TERCEIRO DESCONHECIDO. FRAUDE OPERADA MEDIANTE DEPÓSITO EM CONTA CORRENTE DE PESSOA JÁ FALECIDA. ALEGADA CULPA DA CASA BANCÁRIA AO POSSIBILITAR ABERTURA DE CONTA DE PESSOA MORTA. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. RECURSO DOS AUTORES. PLEITO OBJETIVANDO A RESPONSABILIZAÇÃO DO BANCO DEMANDADO. ALEGAÇÃO DE QUE A CONDUTA NEGLIGENTE DO REQUERIDO CONTRIBUIU PARA FORMALIZAÇÃO DO GOLPE SOFRIDO. INSUBSISTÊNCIA. NEXO CAUSAL ENTRE O DANO E A PRESTAÇÃO DO SERVIÇO BANCÁRIO NÃO EVIDENCIADO. SENTENÇA MANTIDA. REQUERIMENTO DE MANIFESTAÇÃO JUDICIAL PARA FINS DE PREQUESTIONAMENTO. DESCABIMENTO. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. (TJSC, AC 0304413-83.2016.8.24.0064, de São José, rel. Denise Volpato, Sexta Câmara de Direito Civil, j. 05.05.2020). De igual modo, não há imposição legal que obrigue a instituição financeira a cancelar pagamentos já concluídos por ordem do titular da conta, notadamente quando ausente qualquer indício prévio de irregularidade detectável pelos mecanismos de segurança usualmente empregados. Isso porque "o sistema bancário opera de forma automatizada e, uma vez autorizada a transação pelo correntista, o banco cumpre o papel de processar a ordem, inexistindo obrigação de intervir posteriormente para sustá-la, sobretudo quando a operação aparentava, à época da execução, regularidade formal" (TJSC, AC 5033378-16.2024.8.24.0020, rel. Eduardo Gallo Jr., Sexta Câmara de Direito Civil, j. 20.05.2025). Nesse contexto, distante situação excepcional imputável às rés (como falha na prestação do serviço, falha na segurança de seus sistemas internos etc.), inviável responsabilizá-las por fraude praticada por terceiros e pelos atos da própria consumidora. Em última instância, está-se diante da excludente prevista no art. 14, § 3º, do CDC, pois os danos aqui discutidos decorrem exclusivamente de culpa da própria vítima e de ato de terceiro (fortuito externo). Por conseguinte, a sentença de improcedência deve ser mantida incólume, com o desprovimento do recurso interposto pela autora. 3. Dos honorários recursais Por fim, há de se acrescer à verba destinada aos procuradores dos requeridos quantia para remunerá-los pelo trabalho desenvolvido no segundo grau de jurisdição, em decorrência do disposto no respectivo art. 85, §§ 1º e 11, da referida norma. Para tanto, considerando a reduzida complexidade da lide e o tempo decorrido entre a remessa dos autos a esta Corte e seu julgamento (menos de um ano), majora-se o estipêndio advocatício dos causídicos dos requeridos em 2%, cujo total, agora, atinge 12%, mantidos os parâmetros adotados na sentença, suspensa a exigibilidade em relação à parte autora por ser beneficiária da justiça gratuita (evento 10, DESPADEC1). É o quanto basta. Ante o exposto, conheço do recurso e nego-lhe provimento, fixando honorários recursais. assinado por ROSANE PORTELLA WOLFF, Desembargadora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://2g.tjsc.jus.br//verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7051499v6 e do código CRC 2db739f0. Informações adicionais da assinatura: Signatário (a): ROSANE PORTELLA WOLFF Data e Hora: 12/11/2025, às 14:09:27     5003868-40.2023.8.24.0004 7051499 .V6 Conferência de autenticidade emitida em 16/11/2025 16:11:12. Identificações de pessoas físicas foram ocultadas